Monday, August 6, 2012

02/08


Entre o chão e os degraus de uma pequena escada de dois - talvez três - degraus, estava suspenso no ar a noite, eu com meus olhos a pesar de um longo dia, mantinha a cabeça a viajar com alguma bossa a tocar nos fones de ouvido.. Com os cotovelos a encontrar as pernas em uma tentiva de descançar, as mãos apoiavam a cabeça, que olhava os carros a passar rapidamente pela rua, e o tempo a passar devagar no relógio. O olhar perdido no nada, num ato repentino, flagra passando à sua frente esse cara de tempos que a memória guardava, intacta. E em uma fração de segundo passaram milhões de possibilidades dentro da minha cabeça. E agora, o que eu faria? Deixaria ele seguir seu caminho? Eu precisava vê-lo, já fazia muito tempo.. Assoviei. Ele se virou, e estava ali, esse garoto-homem, homem-garoto, ali na minha frente. Sorriu de lado com a surpresa ao olhar para trás, "Só tinha visto a calça laranja, não tinha visto você aí..", e sentou ao meu lado. Meu coração revirava-se em movimentos descompassados, estava tão acelerado que quase perdera meu ar. E foi então que ah!, perdi todo o ar de meus pulmões ao vê-lo sorrir daquele jeito, aquele mesmo jeitinho somente seu, sorriso esse que consegue afastar aqui de dentro tudo o que é ruim e substituir pela façanha do desenhar daquele gesto - senti o coração parar. Conversa vai, conversa vem, foi passando o tempo devagar. Para os que viam-nos de fora: conseguiam vocês entender-nos? Como melhores amigos conversando coisas desde o preço do pão até o futuro da nossa vida. Caminhos divergentes, idéias similares. E dentro de mim, ecoava a vontade de fazer uma curva lá na frente, em uma tentativa de convergir a andada, a fim de encontrar esse cara em uma esquina qualquer. Falávamos nos conhecendo, conhecendo um ao outro tão bem.. Como se não importasse o que o pretérito - imperfeito - havia guardado, dávamos voz ao que o presente vinha a revelar. Era como se, por aqueles minutos, estivéssemos ausentes do mundo exterior, do que a realidade aguardava, e apenas o que se encontrava ali que merecia atenção. Eu sorria de um jeitinho meu, do qual não sorria há tempos. Sabe? Quando se sorri por vezes e vezes de tão inchado de bem que o coração está. Um momento simplório de uma quinta-feira à noite esquecida no calendário, quem diria.. E, entretanto, tudo é real, aconteceu e ficou guardado comigo. Esse é um daqueles momentos que se guarda a sete chaves no fundo na memória; uma cena que se decora e repassa cada palavra de cor e salteado na cabeça antes de o sono alcançar. E por algum motivo, decidi escrever essa memória. "Nos vemos por aí", disse. Se deixar levar nunca fora tão difícil. Deixá-lo ali para voltar à realidade nunca fora tão difícil como naquela hora, onde tudo o que eu queria era ficar ali até que o dia voltasse a aparecer. E assim, me deixei ir daquele momento de felicidade.
Mas se alguém souber a receita da felicidade eterna, por favor, não venha a dizê-la para mim. Pois assim, se eu souber e decidir ser feliz sempre, de nada valerão memórias como essa descrita acima desses pensamentos breves. Esses momentos pequenos irão parar de acalentar essa velha alma de moça.. E esse sorriso que floresce no meu rosto ao sentir a nostalgia do relembrar, nada no mundo poderia provocar felicidade maior.

1 comment:

  1. pelo amor de Deus!... de longe posso gritar que esse texto é o melhor, o melhor.

    ReplyDelete